Desenvolvimento e qualidade dos cuidados em crianças em acolhimento institucional na Beira – Moçambique
Bulaque, Paulo Zebo
Tese
Tese de doutoramento em Psicologia Aplicada
O presente estudo pretende contribuir para o conhecimento científico do impacto do acolhimento
institucional no desenvolvimento de crianças entre os 4 e os 6 anos de idade em Moçambique. Este
estudo integrou dois grupos de crianças: 46 crianças acolhidas em três instituições na Beira,
Moçambique e 46 crianças a viverem com as suas famílias, bem como os cuidadores institucionais e os
pais ou mães das crianças da comunidade. Foram recolhidos dados sociodemográficos dos
participantes. As crianças foram avaliadas em termos de medidas físicas, nível intelectual, competências
de autorregulação e funcionamento emocional/comportamental. Os adultos foram avaliados em termos
de sintomatologia psicopatológica, perceção da qualidade de vida e qualidade dos comportamentos
interativos com a criança. Procedeu-se, ainda, à avaliação de caraterísticas de ambos os contextos.
Crianças institucionalizadas evidenciaram valores de nível clínico no comprimento/altura,
funcionamento cognitivo, e funcionamento emocional/comportamental. A orfandade e o abandono pela
família de origem associaram-se a níveis cognitivos inferiores. O HIV na criança, a rotação do horário e a
ausência de formação específica dos cuidadores relacionaram-se às dificuldades de autorregulação. O
comprimento/altura abaixo do nível normativo, o abandono pela família, e a falta de contactos com a
família estavam associados aos problemas emocionais; por seu lado, os problemas comportamentais
estavam associados também ao comprimento/altura abaixo do nível normativo e ao abandono, bem
como a baixa escolaridade dos cuidadores. Por fim, o comprimento/altura abaixo do nível normativo
bem como o abandono estavam relacionados com o total de problemas emocionais e comportamentais.
Crianças da comunidade apresentaram, também, níveis cognitivos, baixos estando a
desvantagem socioeconómica cumulativa da família associada a essas dificuldades. Verificou-se que as
crianças do sexo masculino evidenciaram mais problemas comportamentais. A sensibilidade parental e
a idade das crianças estavam associadas com a autorregulação e a cooperação parental estava
relacionada com menores dificuldades emocionais e comportamentais.
Crianças institucionalizadas apresentaram menor QI e maiores dificuldades
emocionais/comportamentais do que os seus pares da comunidade. Os prestadores de cuidados
revelaram uma perceção mais positiva da sua qualidade de vida do que os pais biológicos. Porém,
evidenciaram menor sensibilidade e cooperação na interação com a criança.
This study aimed to examine the impact of institutional care in children aged from 4 to 6 years old in
Mozambique. This study included two groups: (i) 46 children living in institutions in Beira – Mozambique,
and their institutional caretakers; (ii) 46 children living with their families, plus their fathers or mothers.
Socio-demographic data has been collected and the children were assessed in terms of physical
measures, intellectual level, self-regulation competences, and emotional/behavioral functioning. The
adults were assessed in terms of psychopathological symptomatology, perception of the quality of life,
and the quality of their interactive behavior with the child. Additionally, the characteristics of the
institutional and familial contexts were evaluated.
Institutionalized children showed low levels of height/length and cognitive functioning, and high
levels of emotional/behavioral problems. Children who were orphans or have been abandoned by their
parents revealed the lowest levels. HIV in children, the caregivers’ turnover, and the lack of specific
training of the caretakers were related to children’s difficulties in self-regulation. Children’s height/length
below the standard level, family abandonment and lack of contacts with the family of origin were
associated with children’s emotional problems; children’s behavioral problems were related to
height/length below the standard level, and the family abandonment was associated with the total
number of emotional and behavioral problems.
Children living with their parents also presented low cognitive levels, and the family cumulative
socioeconomic adversities were associated to children’s low cognitive functioning. Boys presented more
behavioral problems than girls. Parental sensitivity and child’s age were positively associated to selfregulation.
The parental cooperation was associated to lower emotional/behavioral problems displayed
by children.
Institutionalized children have presented lower QI and higher emotional/behavioral problems in
comparison with children living with their families. Comparing with the biological parents, the institutional
caretakers revealed a more positive perception of the quality of life but, showed less sensitivity and
cooperation in the interaction with the child.