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Cuidados de saúde materno-infantis à população imigrante residente em Portugal

Cuidados de saúde materno-infantis à população imigrante residente em Portugal

Topa, Joana Bessa

| 2013 | URI

Thesis

Tese de doutoramento em Psicologia (área de especialização em Psicologia Social)
Num mundo em progressiva movimentação, com sociedades cada vez mais
diversificadas, o número de mulheres a viver a maternidade em contexto multicultural e
migratório é, nos dias de hoje, uma realidade com uma expressão reconhecida, tanto a nível
mundial como nacional. Todavia, o conhecimento em torno da qualidade e da eficácia do acesso
dos/as imigrantes aos cuidados de saúde, especialmente no que respeita às mulheres
imigrantes, é ainda escasso em Portugal (Fonseca, Silva, Esteves & McGarrigle, 2007).
Os estudos sugerem que as mulheres migrantes se deparam com enormes desafios no
que à questão da acessibilidade aos cuidados de saúde diz respeito. As dificuldades parecem
intensificar-se durante a gravidez e a maternidade, períodos de maior vulnerabilidade à doença e
ao risco, para elas e para as/os suas/seus descendentes.
Face a este cenário, a presente dissertação tem por objetivo principal analisar e
caracterizar os cuidados materno-infantis prestados à população imigrante residente em
Portugal. Situada em pressupostos teóricos e epistemológicos críticos oferecidos pelo
construcionismo social, a presente investigação, de natureza qualitativa, compreendeu a
realização de dois estudos empíricos. O estudo 1, pretendeu caracterizar os discursos,
perceções e vivências de trinta mulheres de nacionalidade cabo-verdiana, brasileira e ucraniana
nos cuidados de saúde materno-infantis em Portugal. O estudo 2, pretendeu contribuir para um
melhor conhecimento sobre o acesso e capacidade de resposta do Sistema Nacional de Saúde e
suas/seus profissionais à procura de cuidados por mulheres imigrantes grávidas residentes em
Portugal bem como pretendeu caracterizar os discursos de catorze profissionais de saúde sobre
os cuidados específicos preconizados às mulheres imigrantes durante o período de gravidez,
parto e puerpério.
No estudo 1 através da análise temática efetuada foram identificados dois temasmovimentações
na diáspora e cuidados de saúde materna: facilidades e constrangimentos, cuja
análise em profundidade foi auxiliada pela análise crítica do discurso (Willig, 2003, 2008). Os
resultados mostram, de um modo geral, que os padrões de procura de serviços de saúde para
vigilância de gravidez são tardios. Para isso contribuem as experiências vivenciadas nos diversos
contextos sociais (e.g., experiências discriminatórias) bem como os múltiplos e diferenciados obstáculos que encontram (e.g., culturais, informativos, económicos, comunicacionais,
burocráticas, familiares) quando acedem ou tentam aceder aos serviços. Embora a maioria faça
uma apreciação positiva dos cuidados recebidos, todas elas alertam para a insensibilidade
demonstrada pelas/os profissionais face à diversidade cultural e a constante discriminação
preconizada, que é diferenciada consoante as suas pertenças identitárias. Face às dificuldades
sentidas e aos discursos com os quais vão contactando, estas mulheres vão alimentando uma
noção de si como pessoas com menos direitos, o que as leva conformarem-se com as práticas
ocidentais de cuidado e a silenciar-se face às práticas discriminatórias a que são sujeitas. Deste
modo, os resultados apontam para que as estratégias individuais utilizadas não constituem
qualquer tipo de ameaça ao grupo hegemónico, contribuindo para a manutenção do status quo
(Lewin, 1948/1997) e da desigualdade.
No estudo 2 através da análise temática efetuada foi identificado um grande temaconhecimento,
constrangimentos e práticas face aos cuidados de saúde à população imigrante
grávida, cuja reflexão foi também complexificada com o uso da análise crítica do discurso. Neste
estudo, os resultados apontam para a existência de vários entraves ao acesso das imigrantes aos
cuidados de saúde primários. O desconhecimento da legislação vigente por parte das/os
profissionais, a falta de infraestruturas de gestão capazes de responder às diferentes
necessidades, nomeadamente no que concerne à atribuição de um/a técnico para seguir a
grávida durante um longo período, o tempo limitado das consultas, bem como as barreiras
comunicacionais e linguísticas existentes parecem contribuir para este cenário. Por outro lado,
os resultados mostram que os discursos das/os profissionais são discursos hegemónicos que
levam a uma regulação de saberes das imigrantes em prol do conhecimento biomédico
ocidental.
Assim, as evidências desta investigação apontam para uma assimetria de poderes nas
relações de cuidado materno-infantis, que se por um lado, têm como função proteger as
mulheres garantindo-lhes um melhor bem-estar e prevenção de problemas futuros, por outro
lado, limitam, constrangem e reprimem as ações destas mulheres, aumentando assim a
vulnerabilidade a que estão sujeitas durante o período de gravidez e puerpério.
In a world in progressive movement, with increasingly diverse societies, the number of
women living their motherhood in a multicultural and migration context is a recognized reality
both at global and national levels. However, there’s little knowledge about the quality and
effectiveness of the access of immigrant to the national health care system especially regarding
immigrant women living in Portugal (Fonseca, Silva, McGarrigle & Esteves, 2007).
Studies suggest that migrant women face huge challenges related with the accessibility to
health care matters. These difficulties seem to intensify during pregnancy and maternity periods
because the vulnerability to diseases and risk to women and their descendants increases.
Taking this into account, this paper aims to analyze and characterize the maternal and
child healthcare provided to the immigrant population resident in Portugal. Based on theoretical
and epistemological critical assumptions given by social constructionism, this qualitative research
is divided into two empirical studies. The study 1, intended to characterize (look for the common
features in) the speeches, perceptions and experiences of thirty Capeverdean, Brazilian and
Ukrainian women about the maternal and child health care services in Portugal. Study 2,
intended to contribute to a better understanding of the access and responsiveness of the national
health care system and its professionals towards regnant immigrant women living in Portugal as
well as to characterize the speeches of fourteen health professionals about the specific care
procedures provided to immigrant women during pregnancy, childbirth and postpartum periods.
In study 1, a thematic analysis was conducted and two themes could be identified-
Movements in the Diaspora and Maternal health care: facilities and constraints - whose in-depth
analysis was helped by the critical analysis of the discourse (Willig, 2003, 2008). The results
show, that the search of healthcare services for monitoring pregnancies are generally delayed.
Personal experiences in different social contexts (e.g., experiences of discrimination) as well as
the multiple and different obstacles encountered (e.g., cultural, informational, economic,
communication, bureaucratic, familiar) when accessing or attempting to access services seem to
be an important contribution. Most of the women made a positive assessment of the care
services received but they all warn about the professionals’ insensitivity to cultural diversity and
constant discrimination actions performed, which seems to appear in different shapes and related with their identity characteristics. Given the difficulties experienced and the speeches with
which they contact, these women nurture a sense of themselves as people with fewer rights and
this seems to lead them to comply with Western practices of care and to silence themselves
about the discriminatory practices experienced. The results indicate that the individual strategies
used do not constitute any threat to the hegemonic group and contribute to the maintenance of
the status quo (Lewin, 1948/1997) and inequalities.
In study 2, the thematic/theme analysis conducted identified one central subject-
Knowledge, constraints and practices in relation to health care in pregnant immigrant population.
Once again, the reflection about this matter was performed in accordance with the critical
discourse analysis. In this study, the results point out the existence of several barriers to the
immigrants’ access of primary health care services. The professionals’ lack of knowledge about
legislation, the lack of management infrastructure capable of responding to different needs,
particularly in relation to providing a technician to follow each woman for a long period, the time
constrainments in the medical consultations as well as the language and communication barriers
appear to contribute to this scenario. Moreover, the results show that professionals’ discourses
are hegemonic discourses and lead to a regulation of immigrants’ knowledge in favor of western
biomedical understandings.
Thus, the evidences in this research highlight the presence of power asymmetries in the
relations established in the maternal and child care services. If, on the one hand, these relations
have the duty to protect women ensuring them a better well-being and prevention of future
problems, on the other hand, limit, constrain and restrain the actions of these women while
increasing the vulnerability to which they are subjected during pregnancy and postpartum
periods.

Publicação

Ano de Publicação: 2013

Identificadores

ISBN: 101333234